Simultaneidade nos projetos solares

Por que o integrador tem que estar atento com a Simultaneidade em seus projetos solares? 

A fonte solar é um recurso extraordinário para geração de energia elétrica podendo ser capaz de gerar economia de eletricidade nas unidades consumidoras, captação de recurso para investidores com os diversos modelos de negócios disponíveis, geração de empregos e oportunidades, além de uma verdadeira transição energética no mundo, devido ao vasto e disponível recurso.

A disponibilidade da fonte solar, exclusivamente no Brasil, pode ser vista na Figura 01, onde é apresentada a irradiação global na posição horizontal corroborando que não há região no Brasil que não seja viável o investimento em sistema solares para geração de energia elétrica.  

Figura 01 – Irradiação Solar Global Horizontal Diária Média no Brasil, em Wh/m² dia.  

FONTE: Atlas Brasileiro de Energia Solar, INPE, 2017.  

Com todo esse recurso solar disponível no Brasil, as empresas que trabalham com geração distribuída solar devem, então, estar atentas as novas regras vigentes do setor, e com total aplicação desde o início de 2023, por meio da Lei 14.300 – Marco Legal da Micro e Minigeração Distribuída. Assim, as empresas do ramo de energia precisam se atualizar sobre o tema e, ainda, se aprofundar sobre temas técnicos antes não tão importantes na RN482.

Um desses temas que ganha maior notoriedade é o fator simultaneidade que terá impacto na viabilidade dos projetos solares a partir dessas novas regras vigentes da geração distribuída.  

Entretanto, primeiro se faz necessário definir o que é simultaneidade, as suas características para os projetos solares e qual o impacto na cobrança da TUSD – Fio B.

Como já é de conhecimento geral do setor solar, a cobrança da TUSD – Fio B é percentual e gradativa com o passar dos anos. Assim, desde 2023, os sistemas solares com o pedido de conexão solicitado após o dia 07 de janeiro de 2023, terão a cobrança da sua energia injetada e consumida de 15% da TUSD – Fio B, depois 30% em 2024, depois 45% em 2025 e, assim, subsequentemente até 2029/2031 onde as novas regras definidas pelo Encontro de Contas serão  apresentadas em algum momento pela ANEEL .  

Projetos de sistemas solares com o pedido de orçamento de conexão protocolado antes do dia 07 de janeiro de 2023, foram enquadradas como GD I e possui o Direito Adquirido. Essas unidades consumidoras permanecem com a total compensação da TUSD e não terão cobranças adicionais pelo uso do sistema de distribuição. Já as unidades consumidoras que pediram o orçamento de conexão após o dia 07 de janeiro, poderão estar enquadradas como GD II ou GD III, com uma cobrança proporcional da TUSD – Fio B até 2028/2030 e, depois deste prazo, a implementação das regras definidas pela ANEEL.  

Se o sistema solar for protocolado junto à concessionária até o dia 07 de julho de 2023, essa unidade consumidora ainda terá um adicional dos anos 2029 e 2030 com a manutenção da cobrança de 90% da TUSD – Fio B. Já se os projetos forem protocolados após o dia 07 de julho de 2023, todos estarão dentro das regras definidas por este Encontro de Contas a partir de 2029.  

Neste artigo, serão analisados os impactos da simultaneidade para unidades consumidoras bifásicas na GD II e com sistemas solares protocolados após o dia 07 de julho de 2023. Entretanto, um resumo de qual enquadramento a unidade consumidora e como ficam definidas as porcentagens de  cobrança da TUSD – Fio B para cada um deles pode ser visto na Figura 02.  

Figura 02 – (a) Enquadramento das unidades consumidoras e (b) cobrança da TUSD Fio B de acordo com o enquadramento. 

* Até a data de submissão do artigo não foi apresentado pela ANEEL as regras para o “Encontro de Contas”.  

FONTE: Autor, Julho 2023  

 

PONTOS RELEVANTES SOBRE A SIMULTANEIDADE 

Como já comentado, o fator simultaneidade é um ponto importante para a redução dos impactos da TUSD – Fio B e a formulação mais comum é dada pela Equação 01, onde é igual a divisão entre a Energia Autoconsumida e a Energia Gerada, vezes 100 para ser apresentado de forma percentual.  

Sobre a simultaneidade é importante compreender que a Energia Autoconsumida, em kWh, é relativa à energia gerada pelo sistema solar e consumida diretamente pelos equipamentos elétricos da unidade consumidora e sem a sua injeção no sistema de distribuição elétrica da concessionária. Já a Energia Gerada, também em kWh, é a energia produzida pelo sistema fotovoltaico normalmente indicada diretamente pelo inversor ou nos aplicativos de monitoramento destes equipamentos.  

O seu valor pode variar de 0%, onde não há simultaneidade e toda a energia gerada é injetada na rede elétrica, até 100% onde toda energia é consumida de forma direta pelas cargas da unidade consumidora ou acumulada em sistemas de armazenamento. Analisando esses conceitos, fica claro que o impacto da cobrança da TUSD – Fio B é ligada também a simultaneidade já que maior simultaneidade resulta no menor uso da infraestrutura da concessionária e assim menos ela deve ser remunerada para manutenção dos equipamentos da rede elétrica.  

Deixando esse conceito mais claro e a relação com a cobrança da TUSD Fio B, pode-se usar um exemplo para elucidar esse tema. Então, suponha-se que um sistema solar instalado em uma residência está gerando 500 kWh em um determinado mês e a unidade consumidora está consumindo de forma instantânea 200 kWh no mesmo mês para manter seus eletrodomésticos ligados. Esse consumo é instantâneo e é o que definimos anteriormente de energia autoconsumida, onde não vai ser injetada na infraestrutura da concessionária. Mesmo assim, ainda haverá 300 kWh que irão ser injetados e farão uso dos postes e cabos desta mesma concessionária. Para este montante poderá ou não ter o impacto da TUSD Fio B já que a unidade consumidora poderá recorrer o uso destes excedentes para abater um consumo em horário de não geração, como a noite por exemplo, ou em um horário em que o consumo é maior que a geração de energia pelo sistema fotovoltaico ou, ainda, não utilizar de forma integral já que o seu consumo final foi menor que toda a geração.  

Entretanto é necessário a atenção do integrador nesse ponto, já que a cobrança da TUSD Fio B ocorrerá somente se essa energia injetada pelo sistema solar for requerida novamente no mesmo ciclo de faturamento, como um excedente, ou em futuros ciclos de faturamento, como créditos de energia. O percentual da TUSD Fio B a ser cobrada, seja dos excedentes ou dos créditos, são referentes ao ano em que esses créditos forem requeridos pela unidade consumidora abater o consumo e não o ano da geração. Assim, o sistema solar poderá gerar créditos em 2023, onde a porcentagem da TUSD Fio B é 15%, mas a unidade consumidora ter em fatura a cobrança de 30% se forem utilizados em 2024, por exemplo.   

Voltando ao exemplo do sistema solar residencial, os 200 kWh anteriormente consumidos de forma instantânea pela unidade consumidora gera uma simultaneidade de 40%, o que representaria um valor excelente, e até pouco comum, para um sistema residencial brasileiro. Isso é justificado pelo comportamento médio de uma típica família brasileira, onde é composta por quatro pessoas, onde os dois adultos trabalham durante o dia e as duas crianças estão na escola em período similar. Assim, uma parte significativa da energia gerada vai ser injetada no relógio da concessionária, já que o consumo diário é baixo em relação a geração do sistema solar. 

Para ter uma visão mais clara do que foi comentado, na Figura 03 é apresentado um gráfico com o fator simultaneidade e os conceitos explanados anteriormente. Nesta situação é analisado o consumo e geração solar de 24 horas da unidade consumidora residencial apresentada anteriormente. Se observado os intervalos da meia noite até oito horas da manhã e das vinte horas até a meia noite, a unidade consumidora está requerendo energia elétrica da concessionária para abater o consumo dos eletrodomésticos.   

Figura 03 – Simultaneidade de um sistema solar residencial em um dia de análise. 

FONTE: Autor, Julho 2023  

 

A partir das nove horas da manhã, o sistema solar dimensionado entra em operação e o consumo de energia elétrica da unidade consumidora também aumenta. Este consumo ainda é maior que a geração, proporcionado uma simultaneidade pequena ainda, mas um abatimento de 50% do consumo total e, assim gerando economia.  

Agora no período entre onze horas e dezenove horas a geração solar é maior que o consumo e a simultaneidade é de 100% e, ainda, há a injeção de energia elétrica na concessionária. Toda o consumo está sendo abatido de forma instantânea e há a geração de excedentes que são injetados na rede elétrica da concessionária para serem usados em momentos de baixa ou não geração ou para a conversão de créditos de energia. Um ponto relevante desta análise da simultaneidade é que ela muda de acordo com o consumo e a geração do sistema solar e, assim, os valores de simultaneidade são médios para gerarem aproximações de um caso real.  

Assim, com o passar do tempo e a maior proporção de cobrança da TUSD Fio B, o maior conhecimento do perfil de consumo do cliente ou o monitoramento do comportamento de consumo da unidade consumidora poderão ser um diferencial para as empresas do setor já que inversores poderão ser ajustados para um fornecimento de energia mais equalizado ao consumo ou os excedentes poderão ser armazenados em bancos de bateria para evitar qualquer cobrança da TUSD Fio B.  

Para ter valores mais precisos da relação entre simultaneidade e os impactos da cobrança da TUSD Fio B, retorna-se ao exemplo anterior, um sistema solar instalado junto a carga, agora em uma residência bifásica, com um consumo e geração solar iguais a 500 kWh em um determinado mês. Esta instalação foi liberada pela concessionária local após o dia 07 de julho de 2023, então terá a cobrança gradual da TUSD Fio B de 2023 até 2029 e, posteriormente, estará submetido pelas regras vigentes do Encontro de Contas a serem definidas pela ANEEL.  

Esta unidade consumidora tem o valor da energia elétrica de R$ 0,91/kWh, já inclusos os custos de tributação, onde a TUSD Fio B é proporcional 36% da cobrança do kWh. Não custa lembrar que a cobrança da energia elétrica pela concessionária tem a incidência tributária de 17% de ICMS, mais PIS e COFINS, que variam mensalmente, e que foram fixados em 5% neste exemplo. Um outro ponto importante é que a energia gerada pelo sistema solar, injetada e requerida para abatimento da energia consumida não tem a incidência de ICMS já que a unidade consumidora não pode prestar serviços de compra e venda de energia elétrica gerada por ser um cliente cativo e inserido no mercado de compensação de energia, onde não permite a comercialização de energia, excedentes ou créditos. Essa é a justificativa da energia gerada pela unidade consumidora ter um valor ligeiramente menor que a energia consumida oriunda da concessionária e reforça a atenção de projetistas solares em buscar as maiores simultaneidades possíveis. Neste cenário apresentado, a simultaneidade irá variar de 10% até 100% podendo ser analisada na Figura 04.   

Figura 04 – Sistema solar residencial bifásico com a simultaneidade e o percentual de cobrança da TUSD Fio B variando. 

* Até a data de submissão do artigo não foi apresentado pela ANEEL as regras para o “Encontro de Contas” e, assim, foi utilizado a cobrança de 100% da TUSD Fio B a partir de 2029.  

FONTE: Autor, Julho 2023  

Como a unidade consumidora irá pagar o maior valor entre o custo de disponibilidade e a cobrança da TUSD Fio B, definido pela Lei 14.300, nesta análise é possível observar que nos dois primeiros anos somente o valor referente ao custo de disponibilidade de R$ 45,50 será pago pelo consumidor. Entretanto, com o aumento da TUSD Fio B as menores simultaneidades serão mais afetadas por essa cobrança.  

Vale a pena ressaltar que o integrador deve focar na comparação de uma unidade consumidora com energia solar com uma unidade consumidora sem energia solar onde as vantagens são significativas. Neste exemplo, se o cliente escolhesse não ter energia solar estaria pagando em torno de R$ 455,00, mais a incidência da iluminação pública e cinco vezes a bandeira vigente nesse exemplo.

Assim, olhando o pior cenário de simultaneidade o cliente com energia solar irá pagar somente 26,7% da fatura a partir de 2029, acrescido do mesmo valor de iluminação pública, mas sem levar em consideração que pagará somente uma bandeira vigente por ter gerado toda a energia pelo sistema solar. Isso se reflete em uma ótima vantagem para o cliente mesmo ele com pouca simultaneidade.  

Olhando para os cenários de maior simultaneidade, que podem ser incrementados pelo uso de sistemas de armazenamento já comentados anteriormente, as vantagens são ainda mais interessantes já que ele ficará com uma cobrança média de 10% da fatura de energia e uma situação similar a antiga normativa RN 482.     

CONCLUSÕES 

Este artigo apresentou que o fator simultaneidade é um aliado aos integradores solares e que mesmo com a mudança para a Lei 14.300 não inviabiliza o Brasil e as suas unidades consumidoras junto a carga a investirem em energia solar. Mesmo assim, é importante cada vez mais as empresas integradoras estarem mais atentos em seus projetos e extraírem o melhor custo-benefício que a simultaneidade poderá oferecer ao cliente. 

Para isso, é importante as empresas conhecerem o perfil de consumo presente e futuro da unidade consumidora para que o dimensionamento possa resultar em maiores simultaneidades. Além disso, os projetistas solares não podem esquecer de inserir dados referentes ao decaimento de geração dos sistemas solares já que esse fator poderá impactar na simultaneidade assim como o aumento não planejado do consumo elétrico do cliente.

Estar atento as novas tecnologias que poderão aumentar a simultaneidade como os inversores híbridos e os sistemas de monitoramento poderão agregar valor aos serviços prestados e, ainda, passar maior confiabilidade ao cliente em investir em energia solar.  

Um outro ponto de atenção é o Encontro de Contas, que não foi liberado pela ANEEL no prazo previsto e que durante o desenvolvimento deste artigo ainda não estava disponível. Então, para conhecer o cenário real dos impactos nos custos da energia solar e a real importância da simultaneidade após os anos 2029/2031 ainda carecem mais informações do valor final a ser cobrado na TUSD de quem irá estar no Sistema de Compensação de Energia Elétrica.  

Como já dito em artigos anteriores, é importante que a empresa solar se mantenha atenta as informações liberadas pelo setor de energia, em especial pela ANEEL, mantendo a leitura dos materiais produzidos por especialistas e profissionais competentes. Só estudo aumentarão a assertividade das empresas do setor solar em entregar os melhores projetos ao cliente final que teve o interesse em investir na fonte solar.  

REFERÊNCIAS 

Atlas Brasileiro de Energia Solar, INPE (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), 2017, disponível em: http://labren.ccst.inpe.br/ - visitado no dia 20 de julho de 2023.  

Lei 14.300 – Marco Legal da Microgeração e Minigeração Distribuída, disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2022/lei/L14300.htm#:~:text=LEI%20N%C2%BA%2014.300%2C%20DE%206%20DE%20JANEIRO%20DE%202022&text=Institui%20o%20marco%20legal%20da,1996%3B%20e%20d%C3%A1%20outras%20provid%C3%AAncias – visitado no dia 17 de julho de 2023. 

Dados do Setor de Geração Distribuída, disponível em: https://app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiY2VmMmUwN2QtYWFiOS00ZDE3LWI3NDMtZDk0NGI4MGU2NTkxIiwidCI6IjQwZDZmOWI4LWVjYTctNDZhMi05MmQ0LWVhNGU5YzAxNzBlMSIsImMiOjR9 – visitado no dia 20 de julho de 2023.  

 

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